segunda-feira, 17 de agosto de 2009

Direto da Folha.

segunda-feira, 17 de agosto de 2009

ENTREVISTA DA 2ª

OTACÍLIO CARTAXO
SECRETÁRIO DA RECEITA FEDERAL

Decisão sobre manobra contábil da Petrobras valerá para todos

Em alguns casos, segundo Cartaxo, os efeitos nas empresas poderão ser retroativos

Marcello Casal Jr. - 25.set.08/Agência Brasil







Otacílio Cartaxo, novo secretário da Receita, que foi efetivado no cargo na semana passada



A DECISÃO que a cúpula da Receita Federal tomará sobre as regras para mudança de regime de cálculo do imposto sobre ganhos cambiais -isto é, se é legal ou não a manobra contábil adotada pela Petrobras- valerá para todas as empresas e poderá ter efeitos retroativos.
Efetivado no lugar de Lina Vieira, o secretário da Receita, Otacílio Cartaxo, disse que a arrecadação continuará caindo em relação a 2008. "Estamos comparando um ano de "boi gordo" com um ano de "vaca magra"."

JULIANNA SOFIA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Em entrevista exclusiva à
Folha, a primeira desde que assumiu o cargo, Cartaxo afirmou que, se a manobra da estatal for avalizada pelo fisco -o que é a tendência-, outras empresas poderão requerer a aplicação da regra retroativamente. Se a decisão da Petrobras for condenada, a empresa poderá ser obrigada a recolher os R$ 4 bilhões que deixou de repassar ao fisco com a manobra contábil.
Sobre sua chefe de gabinete, Iraneth Weiler, que endossa o depoimento de Lina sobre o encontro reservado com a ministra Dilma Rousseff (Casa Civil), Cartaxo evita comentários.
Questionado se manterá a servidora no cargo, responde: "Não faça essa pergunta difícil."
Lina Vieira afirmou à
Folha que esteve a sós com Dilma e a ministra lhe pediu para apressar uma investigação do fisco sobre a família Sarney. Dilma nega o encontro. Sobre isso, Cartaxo diz que a ex-secretária nunca comentou o assunto.

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Novo cálculo criou atrito com estatal

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

A divergência interna no fisco sobre a mudança de regime contábil nas operações de câmbio foi o artifício criado pela Receita Federal para tentar explicar a briga nos últimos meses entre a secretaria e a Petrobras.
Em maio, a Petrobras reconheceu que mudou a contabilidade de suas operações em dólar no último trimestre de 2008. No mesmo dia, a Receita -à época comandada por Lina Vieira- avisou que o contribuinte não poderia mudar a fórmula de cálculo do imposto ao longo do ano. Em um "esclarecimento" à imprensa, o órgão afirmou que não era permitida "a alteração de critério no decorrer do ano-calendário".
O episódio provocou uma crise no governo e acabou sendo um dos motivos para a demissão de Lina Vieira, que chefiou a Receita por 11 meses. Foi também a munição usada pela oposição para instalar a CPI da Petrobras.
Na semana passada, em depoimento à comissão, Cartaxo recuou da posição até então assumida pelo fisco. Justificou que há um conflito de interpretação entre as superintendências da Receita. O assunto agora deverá ser decidido pela cúpula da Receita.
Desde 2000, as empresas podem escolher como calcular o impacto da variação do dólar sobre seu lucro. A opção pode ser pelo "regime de caixa", que permite o cálculo do imposto quando a operação em dólar é liquidada e o dinheiro entra em caixa.
A outra forma é o "regime de competência", com o cálculo considerando a variação do dólar no período, com ou sem o dinheiro ter entrado no caixa.

*

FOLHA - O senhor contou com o apoio dos superintendentes para sua efetivação?
OTACÍLIO CARTAXO -
Na Receita, eu trabalhei em tudo. Toda a escadinha da Receita eu subi degrau por degrau. Eles conhecem meu caráter, meu comportamento. Por isso me apoiam.

FOLHA - O sr. chegou a ser investigado pela corregedoria por ter patrimônio incompatível com a renda?
CARTAXO -
A corregedoria escolhe uma série de dirigentes e faz uma auditoria. No órgão central, foram todos os que ocupam cargo de direção. Todos foram auditados. No meu caso, o processo foi arquivado porque não foi constatado nenhum indício de aumento patrimonial descoberto ou gastos incompatíveis com o salário. Li nos jornais que o Ministério Público quer mandar desarquivar, mas foi um lote de 680 auditorias patrimoniais, principalmente de gente ligada ao órgão.

FOLHA - O sr. vai se reunir agora com os superintendentes?
CARTAXO -
Por telefone já conversei com todo mundo. Nós agora vamos fazer uma avaliação mais detalhada e específica e dar uma acelerada nos processos de trabalho. Eu pretendo é dar um ritmo mais forte.

FOLHA - O sr. se refere às críticas que o ministro Guido Mantega [Fazenda] fez à ex-secretária Lina Vieira, que não teria dado celeridade ao plano de trabalho definido por ele?
CARTAXO -
Na parte de fiscalização, precisamos correr mais, fazer uma supervisão mais forte. A Receita sempre acompanhou as grandes empresas. Todos os anos é publicada uma portaria com os critérios para seleção da grandes empresas. Neste ano, foram 10.501 empresas. Ou seja, é jogo aberto, não tem esse negócio de subterfúgio, investigação sigilosa.

FOLHA - Essa ênfase na fiscalização tem o objetivo de inverter a queda na arrecadação?
CARTAXO -
Todas as administrações tributárias modernas fazem o acompanhamento dos grandes contribuintes, que são responsáveis por 80% da nossa arrecadação. Eles são fundamentais para manter arrecadação sob controle. A arrecadação está muito vinculada ao desempenho da economia. Mantê-la alta com a economia afetada pela crise é algo que não cabe dentro da lógica econômica. A grande massa da nossa arrecadação é espontânea, em torno de 95%. Essa matéria contenciosa é apenas 5%.

FOLHA - Nos próximos meses a arrecadação continuará em queda?
CARTAXO -
É. Porque o que se está comparando é o ano de 2008, que foi quando a Receita bateu todos os recordes históricos. Era um momento em que a economia estava "bombando".
No fundo estamos comparando um ano de boi gordo com um ano de vaca magra. Mesmo assim, a arrecadação não voltou aos níveis de 2007. Não se sustentou com os níveis de 2008, em razão da crise, mas não regrediu a 2007. Permanece entre 2007 e 2008. Acho que se sustentou até de forma razoável. Não foi um baque de dimensões tão grandes. Essa queda de arrecadação é em razão da crise e também da política anticíclica que o governo adotou, que está dando certo. Foi uma política benfazeja, embora a Receita tivesse que abrir mão de alguns bilhões.

FOLHA - E o caso Petrobras? Sua explicação na CPI foi suficiente para esclarecer o assunto? Houve pressão?
CARTAXO -
Na CPI, fiz uma exposição didática de como a Receita acompanha os grande contribuintes, as normas gerais de compensação e o regime de apuração das variações cambiais. Na própria Receita há soluções de consulta sobre isso, inclusive no Rio de Janeiro [sede da Petrobras], em que foi concluída a consulta e o órgão admitiu que a empresa pode fazer a opção a qualquer mês do ano, fazendo os ajustes necessários para trás. Existe decisão das delegacias também nesse sentido e no contrário. O assunto está sendo avocado para o órgão central e nós vamos dirimi-lo.

FOLHA - Ou seja, a Receita pode entender que a opção a qualquer momento não é possível, e o caso da Petrobras pode ser revisto e a empresa terá de recolher o imposto?
CARTAXO -
Essa decisão do órgão central valerá "erga ominis", valerá contra todos. Daí vinculará todos os contribuintes e toda a administração tributária.

FOLHA - Só a partir daquele momento ou retroativamente?
CARTAXO -
Em determinadas matérias, a regra geral é a partir daquele momento. Mas tem outras em que comporta excepcionalidade. Os efeitos são para frente e para trás. Isso quem decidirá será a instância técnica, a coordenação de tributação. Eles vão eliminar o conflito de interpretação.

FOLHA - A Receita tem uma estimativa de quanto seria cobrado dos exportadores na questão do crédito-prêmio do IPI?
CARTAXO -
Estamos fazendo uma reestimativa, agora que o Supremo Tribunal Federal decidiu que seria até 1990. Estávamos trabalhando com a hipótese da extinção em 1983. Saindo o acórdão do STF, vamos fazer a leitura técnica para ter um número mais seguro e tomar as providências necessárias.

FOLHA - A ex-secretária Lina conversou com o sr. sobre o encontro reservado que diz ter tido com Dilma?
CARTAXO -
A secretária nunca comentou o assunto comigo.

FOLHA - E a Iraneth Weiler, que trabalhava com a secretária....
CARTAXO -
... ela continua, é chefe de gabinete.

FOLHA - Será mantida?
CARTAXO -
Não faça essa pergunta difícil [risos]. Pelo amor de Deus. Você quer me criar uma dificuldade. Vai ter o depoimento na CPI, ninguém sabe quais as repercussões, se esse caso vai se encerrar. É melhor eu cuidar do meu trabalho. O pessoal da Receita veio me parabenizar nesta semana e eu disse: "Olha, aqui tem duas coisas que a gente precisa: muito trabalho e muita reza".

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